A música como dom de Deus foi dada ao homem ainda no paraíso. Santa Hildegarda, doutora da Igreja, musicista, citou em seus escritos o que se poderia chamar de uma teologia da música. Em carta ao Bispo de Mainz, ela escreve: “Lembremo-nos que, com o pecado, Adão perdeu sua inocência e, em consequência, perdeu também a voz que antes possuía, semelhante à dos Anjos do Céu.
O homem então, pelo pecado original, perdeu a capacidade natural de louvar a Deus com sua voz. Cientes disso, os profetas, inspirados pelo Espírito Santo, foram autores de salmos e cânticos para que o homem pudesse recordar em seu interior a doce sensação de estar no paraíso.
Em seus escritos, Santa Hildegarda afirma sobre essa visão teológica numa luta entre o bem e o mal: “O diabo enganador, tendo ouvido falar que o homem, sob inspiração de Deus, havia começado a cantar os salmos e, por esta maneira era convidado a se lembrar da suavidade da pátria celeste, ficou aterrorizado. E, imediatamente, começou a procurar, na sua maldade, de que maneira podia multiplicar no coração dos homens más sugestões e pensamentos imundos, perturbando ou impedindo a beleza dos cânticos e hinos espirituais”.
O Papa São Gregório também nos ensina que ao se abrir ao canto da salmodia, o homem se eleva no mais íntimo do coração e se abre ao Senhor Todo Poderoso, que assim derrama os mistérios da profecia e da graça da contrição. Como nos afirma o salmo: Aquele que oferece por sacrifício ações de graças me glorifica; e àquele que bem ordena o seu caminho eu mostrarei a salvação de Deus ( Sl 50,23).
Ao mergulharmos no louvor, abre-se então uma via pela qual Jesus pode se revelar para nós. “Tal é o serviço mais sublime que a música pode oferecer, que em nada nega sua dimensão artística, mas ao contrário, a cumpre. Ela libera o caminho obstruído que conduz ao coração, ao centro de nosso ser, ali onde ele entra em contato com o ser do Criador e do Redentor. Ao conseguir fazer isso, a música torna-se o caminho que conduz a Jesus, o caminho pelo qual Deus provou sua salvação. (O Espírito da Música, Bento XVI)”
Como vimos em Santa Hildegarda, São Gregório e Bento XVI, a música, o louvor abre portas para a salvação. Retira o que está obstruindo o coração de se unir a Deus. Ela possibilita a contrição, devolve a nós o que foi tirado pelo pecado original. Dá-nos a graça de sentir o paraíso. Isso é uma teologia da música genuína. Mostra a dignidade e a riqueza da música como instrumento de evangelização.
Desde os seus primórdios, a Igreja soube aproveitar a música como canal direto ao coração do homem. Uma via muito eficaz para que a palavra e os ensinamentos de Jesus pudessem colocar nele seu selo. A música na Igreja sempre teve um papel fundamental tanto em momentos litúrgicos como no anúncio da boa nova aos seus fiéis.
Também testemunhamos cotidianamente os efeitos da música em nossa alma. Uma música que nos conduz a Deus é capaz de nos erguer em meio às frustrações e decepções pelas quais passamos. Assim como acordes e letras que induzem a melancolia, a tristeza, a decepção podem levar ainda mais o ser humano em uma atmosfera de derrota e morte.
Portanto, usar a música na evangelização é garantia eficaz de uma boa pregação. A música tem o poder de penetrar profundamente nossa alma, em áreas que não são alcançadas pela retórica e a escrita. Cantemos, louvemos, e nos abramos novamente ao paraíso!
* Rogéria Moreira (Rogerinha) é missionária da Comunidade Canção Nova, autora dos livros “Aquele que Fala Contigo”, “Mulheres curadas – Transformando a dor em vitória” e “Mulheres empoderadas do Espírito”, todos pela Editora Canção Nova, e lançou o CD Parresia, pela Gravadora Canção Nova